Visto de Casa 03/04
2020/04/10 18:37
| Link permanente
Não sou bom de ouvido. Também nunca tive grande jeito para idiomas, mas as voltas da vida levaram-me a ter que lidar com eles todos os dias. A partir de casa tive que comunicar nos últimos dias, a título pessoal oude comunicação pública, além de português, também em inglês, francês, espanhol e italiano. Quase que só me faltou tentar o grego.
Eu só falo português. Nas outras línguas consigo comunicar. Nalgumas circunstâncias sinto mesmo que consigo comunicar melhor nas línguas que conheço, mas não falo. Tenho que sentir as palavras e adorná-las de expressão. Em português as palavras saltam muitas vezes com demasiada leveza.
Na minha corrida de ontem o “Spotify”, que já me conhece bem, brindou-me com o extraordinário poema/canção do recentemente falecido José Mário Branco intitulado “mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”. O seu refrão é um desafio de beleza, de força e de sabedoria. De facto, “se todo o mundo é composto de mudança, troquemos-lhe as voltas que ainda o dia é uma criança”. Porque não?
Quando corro com música, por vezes em vez de escolher uma lista, um álbum ou um intérprete específico, opto pela escolha que a aplicação “Spotify” me propõe, ou seja, por uma mistura de temas que o algoritmo aprendeu a saber que eu gosto e que por isso seleciona para mim. O Spotify conhece-me cada vez melhor, e como ele conhecem-me muitas outras aplicações com que interajo. É assim comigo e é também com vocês.
O Spotify conhece-me e eu até pago para isso. Já com outras aplicações que me conhecem e também vos conhecem, o modelo é diferente. O serviçosupostamente gratuito que nos prestam é remunerado pelo valor de mercado dos dados que direta ou indiretamente lhes fornecemos.
Ontem refleti convosco sobre a dicotomia entre privacidade e proteção, a propósito do uso das ferramentas digitais no combate à pandemia. Nalguns países os Estados acedem aos dados dos cidadãos e usam-nos com livre arbítrio para desenvolver sistemas digitais de controlo. Uns benignos e outros asfixiantes.
Na União Europeia não é assim. O Comissário francêsThierry Breton, que tem a tutela do digital, anunciou que a União vai comprar dados tratados de forma anónima para os disponibilizar aos investigadores. A escolha europeia é pela privacidade por princípio e nem com um Estado de Emergência sensatamente renovado essa escolha muda. E ainda bem.
Para usarem drones no controlo do confinamento, as forças de segurança portuguesas tiveram que pedir autorização à Comissão Nacional de Proteção de Dados e esta solicitou uma fundamentação e especificação mais robusta para poder apreciar e autorizar. Voltarei neste diário ao tema da privacidade versus proteção, agora que como já aqui escrevi outro dia, a internet é a nova rua. Assim será pelo menos por mais uma quinzena. Até amanhã, com muita saúde para todos.
Comentários