Um Partido (PS) para o Novo Ciclo
2011/07/02 01:24
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Em 1996 por solicitação do então Secretário-geral António Guterres elaborei um documento estratégico de modernização e abertura do PS que veio a ter um forte reflexo nos estatutos e no funcionamento do Partido. Em 1999, conjuntamente com Vitalino Canas apresentámos ao Congresso do Partido uma moção intitulada “Um Partido para o Século XXI” que se viu depois reflectida em alterações estatutárias que fizeram do PS um modelo de abertura e democraticidade formal no seu funcionamento interno.
A participação de independentes na vida partidária e a sua inclusão cada vez maior nas candidaturas e nas equipas de preparação e execução de políticas, a criação de clubes de política, o reforço da interacção com os think tanks como a Fundação Res Pública ou com os movimentos de reflexão e debate como o movimento “Novas Fronteiras”, tornaram o PS um Partido moderno e preparado institucionalmente para os desafios da nova política na sociedade global.
Os ciclos de exercício de poder são sempre difíceis para os Partidos que apoiam as soluções governativas. A interacção sociedade / partido tende a ser progressivamente substituída pela interacção sociedade / governo. Esta mudança de foco tem um risco. O risco da governação ser, como foi no caso do último ciclo de governação do PS, profundamente centrada na solução dos problemas das pessoas (uma marca muito positiva), mas isso fazer por vezes, como fez, perder o sentido de que as pessoas têm que ser cada vez mais os protagonistas das políticas (principal explicação do corte afectivo de parte do eleitorado com o PS).
O regresso à oposição marca também o início de um Novo Ciclo na relação do PS com a sociedade. Os tempos mudaram e o mundo também. Temos hoje redes sociais fortes e movimentos sociais cada vez mais mobilizadores e determinantes. É fundamental que o próximo congresso do PS marque também um novo ciclo do relacionamento do Partido com a sociedade. Um relacionamento que conjugue a valorização da militância com a abertura aos independentes individuais ou organizados e que permita criar uma plataforma de gestação e concretização de dinâmicas de mudança.
No Novo Ciclo, o PS mais do que governar para as pessoas, tem que governar com as pessoas, começando desde já a preparar com elas as linhas fortes da alternativa para a governação, conquistando com isso a maior base social possível para a concretização de políticas informadas pelos valores e princípios da esquerda democrática.
Para isso é fundamental o desenvolvimento de redes de inteligência colectiva e a criação dum laboratório de ideias, retomando de forma moderna e adequada aos novos tempos as velhas funções do Gabinete de Estudos. E importa retomar a Universidade de Verão como momento alargado de reflexão no inicio de cada ano político.
Há no entanto uma tentação em que o PS não pode cair. Para ter uma relação saudável com a sociedade os Partidos têm que ser fortes, consistentes, estruturados, orgulhosos dos seus militantes e sempre abertos ao reforço quantitativo e qualitativo dessa militância. Uma boa relação com os movimentos sociais implica que os Partidos não se queiram substituir a esses movimentos. Cooperar não é anular, ainda que essa anulação tome a forma de aparente fusão.
É nesse sentido que considero que no quadro do modelo político europeu, a adopção do princípio de primárias à “americana” para a escolha dos candidatos é uma ideia atractiva, que merece reflexão e análise, mas que tem riscos que não devem ser menosprezados – o risco da diluição dos partidos na dinâmica dos movimentos sociais com prejuízo para ambos, o risco do populismo, o risco do enfraquecimento estrutural da democracia e o risco de diminuição da capacidade de atracção de novos militantes para refrescarem e dinamizarem o funcionamento partidário.
São riscos suficientes para concluir que começar por aí a modernização funcional do PS é começar a casa pelo telhado. Poderá chegar o tempo de o fazer, mas antes há um longo caminho (e um obrigatório debate interno) a percorrer.
Artigo publicado originalmete no DN de 29 de Junho.
A participação de independentes na vida partidária e a sua inclusão cada vez maior nas candidaturas e nas equipas de preparação e execução de políticas, a criação de clubes de política, o reforço da interacção com os think tanks como a Fundação Res Pública ou com os movimentos de reflexão e debate como o movimento “Novas Fronteiras”, tornaram o PS um Partido moderno e preparado institucionalmente para os desafios da nova política na sociedade global.
Os ciclos de exercício de poder são sempre difíceis para os Partidos que apoiam as soluções governativas. A interacção sociedade / partido tende a ser progressivamente substituída pela interacção sociedade / governo. Esta mudança de foco tem um risco. O risco da governação ser, como foi no caso do último ciclo de governação do PS, profundamente centrada na solução dos problemas das pessoas (uma marca muito positiva), mas isso fazer por vezes, como fez, perder o sentido de que as pessoas têm que ser cada vez mais os protagonistas das políticas (principal explicação do corte afectivo de parte do eleitorado com o PS).
O regresso à oposição marca também o início de um Novo Ciclo na relação do PS com a sociedade. Os tempos mudaram e o mundo também. Temos hoje redes sociais fortes e movimentos sociais cada vez mais mobilizadores e determinantes. É fundamental que o próximo congresso do PS marque também um novo ciclo do relacionamento do Partido com a sociedade. Um relacionamento que conjugue a valorização da militância com a abertura aos independentes individuais ou organizados e que permita criar uma plataforma de gestação e concretização de dinâmicas de mudança.
No Novo Ciclo, o PS mais do que governar para as pessoas, tem que governar com as pessoas, começando desde já a preparar com elas as linhas fortes da alternativa para a governação, conquistando com isso a maior base social possível para a concretização de políticas informadas pelos valores e princípios da esquerda democrática.
Para isso é fundamental o desenvolvimento de redes de inteligência colectiva e a criação dum laboratório de ideias, retomando de forma moderna e adequada aos novos tempos as velhas funções do Gabinete de Estudos. E importa retomar a Universidade de Verão como momento alargado de reflexão no inicio de cada ano político.
Há no entanto uma tentação em que o PS não pode cair. Para ter uma relação saudável com a sociedade os Partidos têm que ser fortes, consistentes, estruturados, orgulhosos dos seus militantes e sempre abertos ao reforço quantitativo e qualitativo dessa militância. Uma boa relação com os movimentos sociais implica que os Partidos não se queiram substituir a esses movimentos. Cooperar não é anular, ainda que essa anulação tome a forma de aparente fusão.
É nesse sentido que considero que no quadro do modelo político europeu, a adopção do princípio de primárias à “americana” para a escolha dos candidatos é uma ideia atractiva, que merece reflexão e análise, mas que tem riscos que não devem ser menosprezados – o risco da diluição dos partidos na dinâmica dos movimentos sociais com prejuízo para ambos, o risco do populismo, o risco do enfraquecimento estrutural da democracia e o risco de diminuição da capacidade de atracção de novos militantes para refrescarem e dinamizarem o funcionamento partidário.
São riscos suficientes para concluir que começar por aí a modernização funcional do PS é começar a casa pelo telhado. Poderá chegar o tempo de o fazer, mas antes há um longo caminho (e um obrigatório debate interno) a percorrer.
Artigo publicado originalmete no DN de 29 de Junho.
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