A voz dos cidadãos europeus
2019/10/12 11:23
| Diário do Sul, Visto do Alentejo
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O Parlamento Europeu (PE), constituído por 751 membros eleitos nos 28 Estados -membros da União Europeia (UE), tem vindo a ganhar um peso progressivo na arquitetura institucional da União.
Cabendo à Comissão Europeia o poder de iniciativa no plano legislativo, o Parlamento dispõe de poderes de co-decisão nas matérias estruturantes do projeto europeu.
Sendo a co-decisão pela sua natureza um processo negocial entre iguais, a visibilidade do Conselho Europeu, onde têm assento os Chefes de Estado e os Governos, é muito superior ao do Parlamento, onde os cidadãos são diretamente representados.
A percepção de que na União o método comunitário tem vindo a perder terreno para a abordagem intergovernamental têm aderência à realidade. Para além da substância, os governos têm um poder acrescido na comunicação de proximidade e nas decisões financeiras, enquanto o Parlamento desempenha um papel mais intermédio de concertação política e territorial.
Independentemente do juízo concreto sobre os fundamentos da decisão, a rejeição pelo Parlamento Europeu da Comissária proposta pelo Governo Francês, Sylvie Goulard, constituiu uma afirmação do PE como câmara dos cidadãos e não caixa de ressonância dos governos, em particular dos governos dos países mais poderosos da União.
Nas horas que antecederam a decisão, em que participei ativamente como membro de uma das comissões parlamentares avaliadoras, foram esgrimidos múltiplos argumentos a favor e contra a rejeição.
O mais eficaz e decisivo de todos foi a repetição de uma pergunta retórica; será que uma ou um candidato de um pequeno ou médio país da União, com as dúvidas éticas e a fragilidade exposta nas audições pela Comissária indigitada por França, seria aprovado? Claro que não seria, como aliás o tinha demonstrado a rejeiçãoanterior feita pela comissão dos assuntos jurídicos dos candidatos indigitados pelos governos da Hungria e da Roménia.
Não pretendo neste texto dissecar a substância do processo de avaliação da Comissária, a adequação do seu perfil à missão atribuída ou a avaliação da sua competência. O seu Curriculum técnico-político é bem superior à qualidade das suas prestações concretas nas audições. O resultado mostrou que a circunstância se sobrepôs ao percurso.
Múltiplas explicações haverão para este facto. A afirmação do PE como uma voz de todos os cidadãos europeus é uma delas. É discutível a oportunidade, mas é indiscutível a motivação. Que sirva de lição às tentações de criar diretórios de decisão acima do escrutínio de quem foi eleito para representar diretamente os cidadãos da UE.
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