Uma rede pelo Futuro
Nada se perde, tudo se transforma, é uma simplificação da lei de Lavoisier, que pode ser servir de inspiração para refletirmos nestes tempos de grandes mudanças. De repente tudo o que parecia verdade na constelação geopolítica passou a ser verdade de outra maneira, porque em última análise o que conta sempre são os poderes e a forma como se equilibram e mexem com o planeta e com a vida de tudo o que nele se desenvolve, incluindo cada um de nós.
A mãe de todas as dicotomias é a que separa a liberdade da servidão. Em torno dela vão-se alinhando os valores e os interesses e gerando os equilíbrios e os desequilíbriosatravés dos quais a humanidade foi fazendo o seu caminho. Cada um de nós olha a história e o seu reflexo na realidade pela narrativa que fomos assimilando a partir da multiplicidade infinda dos factos que a fizeram acontecer. Para os que não são especialistas, como eu não sou, emergem bem nítidas na fita do tempo as alternâncias entre as etapas marcadas por civilizações dominantes e os momentos em se deram profundos choques civilizacionais.
A invasão da Ucrânia pela Federação Russa esboçou um choque civilizacional forte, que mais do que um choque de culturas ou de tradições ou ambições, parece ter prevalecido a ideia base da fratura entre a possibilidade de escolher entre a soberania e a dependência, entre a autodeterminação e a dominação pelo mais forte.
Neste contexto, parece apelativa a ideia de uma demarcação do mundo entre os que preservam a liberdade e os que que a espezinham, como pareceu ser apelativa aos que traçaram a régua e esquadro a geografia pós segunda guerra mundial acantonar as forças entre dois blocos e uma mão cheia de não alinhados para ir dando folga ao modelo.
Nessa dicotomia não hesito em escolher de que lado estou, mas também não tenho ilusões sobre a porosidade e a flexibilidade com por vezes se redesenham os equilíbriosde poder à escala global. Por isso defendo e voltei a defender em Estrasburgo como copresidente da 41 Assembleia Parlamentar Paritária África, Caraíbas e Pacífico / União Europeia que os povos e os seus representantes eleitos se devem constituir numa rede de segurança unida pela tolerância, a compreensão mútua e a legítima aspiraçãocoletiva a uma vida digna e feliz.
Se tratarmos do terreno e nele lançarmos boas sementes, não garantimos, como nunca ninguém garantiu a paz perpétua ou o fim da história, mas poderemos resgatar para os povos o controlo do seu destino comum.