Tudo Bons Rapazes
2014/08/10 15:34
| Diário do Sul, Visto do Alentejo
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No contexto da disputa interna que está a decorrer no PS tive uma
interessante conversa com um dos meus colegas de Partido que mais admiro. Um
analista já muito experiente do fenómeno político. Dizia-me ele que existe uma
ética política em cada ator ou organização, mas não uma moral específica, ou
antes, a moral prevalecente na política é a moral da afirmação do poder, no
quadro constitucional ou legal em que essa afirmação se processa.
Um pouco na linha dos ensinamentos
de Maquiavel, o meu colega não chegou ao ponto de me dizer que os fins
justificam os meios, mas defendeu com argumentos fortes que os meios devem ser
os adequados para atingir os fins, o que em última análise só constitui uma
divergência semântica. Quanto à ética, para o meu interlocutor, ela reside nos
valores e na forma. Segundo ele, se tivermos a crença de que o nosso projeto é o
melhor para a comunidade que representamos, temos o dever moral de lutar por
ele, mesmo que isso signifique abater inimigos externos ou internos. Este
abater, literal no passado, é hoje um conceito simbólico de destruição
política.
Esta conversa pela sua frontalidade e pelo perfil do meu amigo
marcou-me muito. Os meus leitores sabem que nas crónicas de Agosto costumo fazer
algumas incursões mais pessoais e é o que volto a fazer neste texto. Confesso que
esta conversa me fez reler alguns textos de psicologia política e atualizar
algumas leituras sobre novas áreas de investigação. E lá voltei a ver as
análises das histórias de sucesso político e da emergência dos “misericordiosos”
sobre todos os outros na sociedade mediática em que vivemos. Este é o tempo dos
bons rapazes (e das boas raparigas).
Com uma moral reduzida à aplicação bem calibrada do instinto matador
compreende-se que quem mata sempre se torna mais cedo ou mais tarde odiado pela
prepotência e que quem nunca mata acabe por ficar rotulado de benévolo, para
usar um termo também ele benevolente. O povo “adora”, hoje como no passado, os
que matando por norma se glorificam pelo perdão ocasional. Era assim no circo
romano. É assim no “circo” político-mediático em que vivemos.
Sou um professor universitário que adora política. Não estranho por
isso quando os meus amigos me dizem que eu não pareço um político como os
outros. Detesto estereótipos. Os
políticos representam o espectro social em que se inserem. E concordo com eles
quando dizem que não tenho instinto matador. Que procuro compreender o lado
humano mesmo dos que me tentam “matar”. Que quando venço não exijo o troféu da
humilhação do outro.
Um outro amigo costuma dizer-me que só há duas opções. Confiar que
todas as pessoas são boas e depois ter desilusões ou desconfiar que todas são
más e depois ter boas surpresas. Segundo este amigo na ação política deve-se
escolher o segundo caminho. Eu escolhi o primeiro e não me arrependo. A minha
vida tem sido inundada de gente boa e isso compensa todas as desilusões do
percurso. Agradeço a todos os que confiei e que confiaram em mim, porque temos
feito acontecer.
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