Ventos de Espanha
As eleições gerais espanholas de 23 de julho, determinantes para o futuro do País, eram também muito importantes pelos sinais que nelas os espanhóis poderiam dar para a península ibérica, para a Europa e para o mundo.
Os resultados verificados abriram mais interrogações do que respostas. As incógnitas levarão a um complexo desafio de negociação política durante as próximas semanas ou meses. As respostas merecem ser avaliadas com atenção muito para lá das fronteiras espanholas.
No plano das negociações, muitos cenários estão em cima da mesa, parecendo, no momento que escrevo este texto, que uma reinvestidura de Pedro Sanchez como chefe do Governo é o mais provável de se concretizar. Os cenários de uma investidura do líder do Partido Popular (PP) Nunez Feijóo ou da repetição das eleições não podem, no entanto, serem descartados.
Para além do enredo da formação do Governo, complexo, mas estimulante para quem gosta de política, algumas ilações podem der desde já retiradas dos ventos que a democracia espanhola espalhou pelo mundo.
Em primeiro lugar parece mais ou menos assegurado que Espanha vai poder cumprir sem grandes contratempos o seu Programa da Presidência do Conselho da União Europeia cujos eixos, como o reequilíbrio geopolítico da UE ao Sul, a política para as migrações ou a reindustrialização são decisivos para o futuro da União.
Em segundo lugar foi muito clara a recusa do eleitorado espanhol em permitir que as portas do governo fossem abertas à extrema direita. Acredito que as experiências regionais e locais que ocorreram depois das eleições de 28 de maio, com os retrocessoscivilizacionais impostos pela extrema direita nos programas de governação conjunta com a direita tradicional, funcionaram como um alerta que enfraqueceu os radicais e diminuiu também as possibilidades de a direita ambicionar ter uma maioria para governar.
Em terceiro lugar foi de alguma forma inesperada, mas extremamente importante para a coesão do Estado Espanhol, mais ou menos federalista, a vitória clara que os eleitores da Cataluna deram ao Partido Socialista (PSC), representante naquela região autónoma do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), em detrimento dos Partidos e movimentos independentistas.
Finalmente realço a lição que os ventos de Espanha deveriam constituir para a direita portuguesa. Nas legislativas de 2022 pagou a fatura da fenda aberta nos Açores, mas tal como o seu partido irmão espanhol, continua no meio da ponte, sem uma posição clara e confiável. Já não pode alegar que não conhece o preço político dessa escolha.