Esquerda versus Direita - Hoje
2018/12/30 11:49
| Diário do Sul, Visto do Alentejo
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Mesmo para quem não perfilha uma visão dialética da história, os tempos são sempre marcados por dilemas e dicotomias sobre os quais os povos exercem a sua escolha e determinam o seu futuro.
Essas escolhas têm sido também a base dos quadros de valores éticos e dos programas de ação política que definem as tipologias políticas, designadamente a fronteira vasta entre a esquerda e a direita.
Durante décadas após o início da transformação industrial a grande escolha foi definida no plano social e na detenção dos meios de produção. Foram tempos em que a direita pugnava por uma liberdade baseada no destino e nas capacidades e recursos herdados ou adquiridos e a esquerda se focava na igualdade e na equiparação ideal de cada ser humano no acesso às condições de realização e de vida decente.
Em ambos os casos, a moderação prevaleceu muitas vezes temperada pelo respeito pela vontade dos povos manifesta de forma democrática e noutras vezes foi deturpada por extremismos radicais e cerceadores dessa expressão democrática.
Com a evolução do modelo económico, a base da dicotomia foi passando progressivamente da posse dos meios de produção para a visão cultural sobre a aceitação da diferença, opondo os valores conservadores e supremacistas predominantes à direita aos valores transformadores e respeitadores das escolhas de cada grupo à esquerda.
Mais uma vez esta dicotomia, ainda bem presente, foi por vezes democrática e respeitadora da vontade das partes e outras vezes enquistada e praticada de forma unilateral e autoritária.
Nos dias de hoje, com os efeitos da globalização e da transformação digital a penetrarem cada vez mais na sociedade, estamos a assistir à formação de uma nova dicotomia. A direita, em particular a direita populista,aposta na culpa para captar votos e capitalizar descontentamentos. É a culpa do comércio global, das migrações, das partilhas de soberania, da tolerância e da aceitação da diferença.
Enquanto o ressentimento fermenta à direita, aesquerda democrática hesita em assumir com naturalidade a missão de ser a geradora de novas soluções, que respeitando a dignidade, a identidade e expetativa de realização de cada pessoa e de cada comunidade, seja capaz de gerar uma dimensão agregadora e viável de bem-estar comum, capaz de recuperar a esperança e a confiança.
A direita tem uma narrativa mobilizadora contra a modernidade. Falta à esquerda ocupar o seu espaço natural desenvolvendo e aplicando uma narrativa mobilizadora a favor dela, para que a história siga o seu caminho com os dois motores ligados.
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