A Bofetada
Emmanuel Macron, Presidente da República Francesa, optou por uma prática de maior proximidade e diálogo com a sociedade civil, como antídoto ao designado movimento dos coletes amarelos que eclodiu em 2018.
Esta forma de exercício da magistratura presidencial, também praticada com grande desenvoltura pelo Presidente da República Portuguesa Marcelo Rebelo de Sousa, exige uma capacidade natural dos seus protagonistas para a exercer e também coragem e cuidada gestão do risco inerente, em sociedades nas quais o discurso de ódio, a fragmentação e o apelo à violência são cada vez mais inflacionados por grupos organizados, alguns deles com reconhecidas ligações a redes internacionais que propagam o radicalismo populista e disruptivo.
No nosso País a proximidade do Presidente da República com as pessoas, seguida também por outros representantes políticos, tem sobretudo gerado “selfies” e um ou outro arrufo de menor importância. Em França, dia 8 de junho, à saída de uma escola de hotelaria no sudoeste de França, onde se tinha reunido com empresários e estudantes de restauração para debater o impacto da pandemia, e quando cumprimentava os populares que se juntavam à sua passagem, Macron foi esbofeteado por um dos presentes.
Estando por esses dias em França, mais propriamente em Estrasburgo, a participar na sessão plenária do Parlamento Europeu que regressou, após 15 meses de sessões em Bruxelas, à sede estipulada nos Tratados, pude acompanhar o profundo debate que esta situação gerou na sociedade francesa.
Macron teve a solidariedade de todos os quadrantes políticos, embora os mais radicais e populistas não tivessem perdido a oportunidade de transformar o episódio num sinal mais vasto de rejeição do Presidente num momento de arranque para as Eleições Presidenciais de abril do próximo ano. Houve também quem tivesse colocado em causa a incapacidade de antecipação dos serviços de segurança, embora a resposta tenha sido imediata e cerceadora de males maiores.
O mais interessante do debate, no entanto, foi a confronto de ideias entre os que defenderam que com os riscos inerentes a uma sociedade complexa e muitas vezes manipulada, figuras como o Presidente da República deveriam expor-se menos ao contacto direto e os que pelo contrário, argumentaram que isso seria aceitar a derrota do diálogo e da proximidade e ceder aos que procuram usar o medo para destruir a democracia. Concordo com a segunda perspetiva. A democracia vale bem uma bofetada, embora não deva dar a outra face, sem se precaver das intenções de quem a confronta.