Clima (pouco) ameno

 Vivemos um janeiro ainda mais invernoso do que é normal. O frio, a chuva e a doença têm-se vindo a entranhar em todo o País e não há quem não aspire a uma rápida Primavera, mais solarenga e mais saudável.

 

Nas minhas experiências concretas de vida em comunidade, nestes tempos de pandemia, tenho vindo a perder a esperança de que as dificuldades sejam, como alguns defenderam e outros ainda defendem, um sofrimento redentor que nos dará uma nova consciência das coisas de uma forma global. Pode ser que esteja enganado e ficarei muito satisfeito se estiver, mas não é por esse caminho que me conduz a intuição

 

Num recente debate no Parlamento Europeu defendi que com tantas pessoas a sofrer, ser pragmático é o primeiro dos valores. Uma condição de humanismo e de prevenção do populismo. Em conformidade, mesmo não deixando apagar totalmente a chama de uma possível reinvenção global pós-pandémica da humanidade, defendo que devemos começar por aproveitar todos os fragmentos de consciencialização que nos permitam corrigir as coisas e melhor a vida das pessoas, tornando a sociedade mais justa.

 

Um desses fragmentos, é tomarmos de vez consciência de que, exceto para atração turística, que quando a oferta for de qualidade pode reivindicar a amenidade do nosso clima, para a generalidade aos portugueses e das portuguesas o nosso clima não é ameno e há muita gente a passar um frio que não deveria no inverno, um calor difícil de aguentar no verão e a sustentar contas de energia, que não obstante as tarifas sociais, são muitas vezes pagas em prejuízo de outros bens básicos para uma vida digna.

 

Os mais recentes programas quadro para a coesão têm reservado verbas assinaláveis para a eficiência energética e incluem sistemas de apoio à melhoria na construção e sobretudo na requalificação do património edificado. Muito foi feito, mas perante os que se passou nos ultimas semanas ficou ainda mais clara que os regulamentos deixaram de fora os mais pobres e vulneráveis, que habitam muitas vezes em casas muito degradadas e com contratos de arrendamento que nem permitem ao rendeiro nem ao arrendatário sustentar a obra necessária.  

 

Num momento em que se desenham e lançam os novos programas de recuperação e resiliência, o foco na requalificação do parque habitacional mais degradado parece-me uma óbvia. Uma prioridade que tem que ser aplicada com critérios de proximidade, envolvendo também as autarquias, e aplicando regulamentos transparentes, mas desburocratizados, para permitir um acesso de quem mais precisa à dignidade e ao conforto que não brota da ideia feita de que somos um País climaticamente ameno.

 

 

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