O Canto do Cisne
O título deste texto expressa um desejo, mas não configura nenhuma certeza. A brutal agressão de Putin ao território da Ucrânia tem uma motivação ideológica e imperialista que fundamenta uma estratégia de expansão, mas já percebemos que não tem fronteiras éticas ou morais que permitam antecipar as táticas que sucessivamente serão usadas.
Não vou por isso escrever sobre os factos que estão a ocorrer, porque a escrita, fosse ela qual fosse, ficaria desatualizada muito antes de ser lida por outro que não eu próprio. A motivação estratégica de Putin, sendo militarmente ofensiva é duplamente defensiva no plano político. Defensiva porque não aceita a supremacia prática nos resultados económicos, políticos e sociais dos regimes democráticos que foram instaurados em territórios da antiga União Soviética, sobre os regimes autoritários como o adotado pela Rússia e os seus satélites, e defensiva porque teme que a prazo isso conduza à sublevação do povo russo contra o seu despotismo.
O que está a acontecer na Ucrânia, para além da anexação territorial cuja dimensão e permanência os próximos tempos delimitarão é uma anexação político-ideológica, como aquela que já foi consumada noutros territórios limítrofes e tem sido tentada noutras latitudes através da desinformação, dos ciberataques e do financiamento de forças políticas extremistas e desestabilizadoras.
Para que o conflito Rússia - Ucrânia possa ser o canto do cisne do regime autoritário que impera em Moscovo é preciso não confundir esse regime com o povo russo, responder de forma articulada, unida e proporcionada, retaliar de forma focada de forma atingir os responsáveis, não permitir escalar a guerra para patamares em que já não há vencedores nem vencidos e amarrar de vez as redes de segurança e defesa de quem defende o direito internacional, o estado de direito, a liberdade e a democracia.
Este conflito brutal e de elevado risco mostra mais uma vez a importância de apostar nas relações multilaterais, na interdependência e na entreajuda entre os povos, no eliminar de posições dominantes como aquelas que por exemplo a Rússia detêm sobre os países vizinhos em termos de energia, no reerguer da Organização das Nações Unidas como fórum para o enraizamento de uma comunidade internacional pela paz, pelo diálogo e pelo desenvolvimento sustentável.
A minha solidariedade ativa com o povo da Ucrânia e com todos os povos oprimidos do mundo. Que o canto do cisne seja de quem não merece voltar a cantar.