Triângulo do Fogo
Os números não enganam. Ao longo da história sempre existiram estios mais quentes que outros e recordo-me bem ao longo da minha vida de alguns verões abrasadores na nossa terra, mas agora as ondas de calor são mais frequentes, mais intensas e atingem latitudes de que dantes não se aproximavam.
Há duas décadas tive responsabilidades políticas diretas como Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna com a tutela delegada da Proteção e Socorro e por isso acompanhei de muito perto o fenómeno dos fogos florestais. Sei bem quão complexo é combater esses fogos quando as condições de temperatura, velocidade do vento e humidade são adversas, o numero de ignições se multiplica, a orografia e os acessos não facilitam e o cansaço dos operacionais se acumula e o desgaste dos materiais se evidencia.
Desde essa altura até hoje muita coisa mudou. Os nossos extraordinários bombeiros e restantes forças de resposta estão mais organizados e preparados, o dispositivo é mais robusto e diversificado, existem melhores equipamentos de combate com destaque para os meios aéreos, melhores comunicações e melhor conhecimento do terreno.
Mas a capacidade de resposta às ocorrências é apenas uma componente, sem duvida a mais visível, mas não a mais estrutural, daquilo a que os especialistas designam como triângulo do fogo. É o vértice que é acionado quando os outros falham. Nos dois outros vértices as circunstâncias têm vindo a complicar-se de forma conjugada. Por um lado, o aquecimento climático provoca alterações meteorológicas cada vez mais evidentes. Este ano vivemos uma seca extrema associada a temperaturas extremas, o que leva a que a propagação dos incêndios tenha mais um fator de aceleração. Por outro lado, ainda que tenha havido um esforço considerável de limpeza das matas, a realidade demonstra que ele ainda não foi insuficiente sobretudo em zonas de pequena propriedade, e além disso há cada vez mais construções em zonas de transição que sendo a seguir às vidas humanas a prioridade de defesa, têm que ser cada vez mais planeadas para estar a salvo das novas condições em que os fogos se propagam.
O valor, a entrega, a preparação e empenho das mulheres e dos homens que nos protegem tem vindo a ser bem demonstrado de novo este ano. Temos que ser todos seus aliados. Cada um de nós tem uma pequena, mas importante palavra a dizer para que o triângulo do fogo volte a estar ao alcance do controlo humano, com mitigação de danos e proteção de vidas e do património construído e natural dos territórios.